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ECONOMIA - Falta de dados impede retrato fiel do desemprego no país durante pandemia


05/05/2020
Brasil
O Globo

Economistas e entidades representativas do setor produtivo enfrentam dificuldades para prever o impacto da crise no mercado de trabalho e no consumo das famílias e planejar ações contra a crise.

O principal levantamento sobre o emprego e a situação social das famílias está comprometido. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnadc), do IBGE, conseguiu pouco mais de 60% de respostas no levantamento de março, feito parcialmente por telefone por causa da pandemia. No mês anterior, aproximara-se de 88%.

A divulgação pelo Ministério da Economia do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), que contabiliza demissões e admissões formais, está suspensa desde janeiro. E o apagão se agravou com a pandemia.

A Confederação Nacional do Comércio (CNC) precisou recorrer a empresas privadas e ferramentas de pesquisa na internet para fazer estimativas sobre o impacto da paralisia nas vendas do setor, o que pode ceifar 2,2 milhões de vagas com carteira assinada. Segundo o economista da entidade, Fabio Bentes, a falta do Caged dificulta uma ação mais precisa nos próximos meses:

— Estamos navegando às escuras. Estamos no meio de uma tempestade, e a bússola quebrou.

O presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic), José Carlos Martins, diz que a falta de dados prejudica investimentos porque as demissões têm impacto direto na arrecadação do FGTS, uma das principais fontes de recursos para projetos imobiliários:

— Como vamos continuar as obras se não sabemos se haverá recursos? Se você me pedir hoje um quadro nacional, setores e estados que mais demitiram, não sei com clareza.

A Pnadc não mostra só o movimento do emprego formal. Traz dados imprescindíveis para entender a situação dos sem carteira, conta própria, empregados domésticos e outros informais. No primeiro índice trimestral, divulgado na última quinta-feira, houve queda da ocupação em todos esses grupos de trabalhadores. O levantamento traz ainda informações por escolaridade, região e até por município.

PNADc de abril ameaçada

Sem poder ir às casas dos trabalhadores, o IBGE usa seu cadastro para entrevistas a distância, mas ele está defasado. Uma medida provisória foi editada para dar ao órgão acesso às listas das operadoras de telefonia celular, mas foi suspensa pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a pedido de partidos e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Temem pela privacidade do cidadão.

O IBGE está usando agora uma lista da Anatel de 2019 para fazer o levantamento, mas, ao apresentar os números de março, o diretor adjunto de Pesquisas do instituto, Cimar Azeredo, disse não poder garantir a pesquisa de abril:

— Se eu disser que vai ter em abril, seria irresponsável, mas estamos fazendo uma insistência grande para que isso seja feito.

Simon Schwartzman, sociólogo que presidiu o IBGE de 1994 a 1998, alerta que, sem dados, políticas públicas ficam mais erráticas:

— A Pnadc mostra os setores mais afetados, os municípios. É uma informação importante para identificar os grupos mais vulneráveis. Se o IBGE não tiver uma listagem atual, vai errar mais. Como todo mundo tem celular, com uma listagem mais completa é mais fácil de alcançar as pessoas. A qualidade do dado melhora.

Schwartzman acredita que o IBGE vai continuar produzindo as pesquisas de trabalho, importante fonte de dados para o cálculo do Produto Interno Bruto (PIB), cujo resultado do primeiro trimestre será divulgado no fim do mês. Mesma avaliação tem outro ex-presidente do IBGE, Edmar Bacha, mas ele ressalta que as informações terão um “grau de confiabilidade menor”:

—O IBGE tem de atualizar o cadastro para os censos, e há um esforço de usar registros administrativos. É uma maluquice, um absurdo, o IBGE não poder ter acesso a nome, endereço e telefone das pessoas. Se fosse a Telebrás (empresa pública de telefonia privatizada em 1998), era de estatal para estatal. Mas operadoras são proprietárias dos dados.

O vice-presidente da Confederação Nacional de Serviços (CNS), Luigi Nese, diz que, com exceção dos subsetores de saúde, informática e telecomunicações, todos os demais são fortemente afetados pela crise.

Contudo, não consegue saber precisamente quais são os mais atingidos. Ele sabe que restaurantes, bares, barbearias, salões de beleza estão todos fechados, mas não tem ideia de quantos empregados foram ou poderão ser demitidos.

— Isso é muito ruim porque informação é item primordial neste momento — disse Nese, que enviou ofício ao governo federal pedindo explicações.

O presidente da seção paulista do Sindicato das Empresas e Serviços Contábeis (Sescon-SP), Reynaldo Lima Júnior, reforça a preocupação:

— O Caged é muito importante para auxiliar as empresas na tomada de decisão. Ficamos sem referência, às cegas.

Economista da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Maria Carolina Marques diz que sondagens da entidade não captam totalmente o choque nos empregos:

— Faltam dados concretos, do mês fechado.

Sem prazo para o Caged

Se o Caged estivesse ativo, já seria possível ter os dados de abril e até de meados de maio, porque as empresas repassavam as informações até o sétimo dia do mês seguinte.

O Caged parou com a decisão do governo de migrar os dados para a plataforma e-social em janeiro. O novo sistema é mais abrangente e complexo. Muitas empresas, sobretudo pequenas, tiveram dificuldades para inserir dados.

O governo deu mais prazo de adaptação e, com a pandemia, não tem previsão de retomar a divulgação do cadastro, que traz dados sobre renda, idade e sexo dos trabalhadores, além de porte e distribuição regional dos empregadores.

Para o consultor Rodolfo Torelly, o ideal teria sido manter os dois sistemas funcionando até completar a transição:

— O Caged funcionou por 54 anos, estava incorporado à rotina das empresas.

Torelly lembra que o Caged é usado pelo Sistema S, integra a base do Cadastro Nacional de Informações Sociais (Cnis), da Previdência Social, e complementa informações do seguro-desemprego, cujos dados têm sido mascarados pela fila de ao menos 200 mil pedidos à espera do benefício.

A Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, do Ministério da Economia, diz que não há previsão para a retomada da divulgação do Caged porque muitos empregadores estão sem certificado digital e sem serviços de contabilidade, com muitos funcionários em home office.

A secretaria diz que a base de dados existente não é confiável porque há a suspeita de que algumas empresas só informaram admissões em janeiro ou não fizeram qualquer declaração.

“Montamos um grupo de trabalho com IBGE, Ipea, FGV, PUC e Insper, para que os dados possam ser certificados pelos maiores especialistas do país e voltem a ser publicados com total qualidade”, informou a secretaria, acrescentando que alguns dados podem ser liberados em maio.

https://oglobo.globo.com/economia/apagao-estatistico-falta-de-dados-impede-retrato-fiel-do-desemprego-no-pais-durante-pandemia-24407475


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